Diário de campo
Rio Ibicuí (RS)
A navegação do Rio Ibicuí, no Rio Grande do Sul, foi realizada durante 5 dias, entre 16-20 de abril de 2007.
O Rio Ibicuí é formado na confluência de dois rios, o Ibicuí-Mirim e o Toropi. Ganha mais corpo ao receber as águas do Rio Santa Maria, perto de Cacequi. Percorre 386 km até a foz no Rio Uruguai, do qual é o afluente mais importante. No verão, quando o rio está mais baixo e surgem suas lindas praias de areia branca, é justamente a época quando a água também é retirada para a irrigação dos arrozais, principal lavoura ao longo de sua bacia. Em toda sua extensão, existe apenas uma cidade – Manoel Viana – nas margens do rio.
Vale ressaltar que o barco utilizado nas navegações usa o motor de popa Evinrude E-Tech, o mais ecológico disponível no mercado que, além de usar até 75% menos óleo que os motores 2 tempos, emite um volume de monóxido de carbono até 50% menor que qualquer motor 4 tempos.
Acompanhe aqui nosso Diário de Campo:
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15/04/07 São Vicente do Sul
Estávamos quase chegando ao nosso destino. Passamos por Santa Maria no momento em que o sol alaranjado mergulhou no horizonte da noite, nos deixando com um glorioso céu estrelado. Já são três mil quilômetros rodados desde Brasília, e ainda nem começamos a expedição pelo Ibicuí! Ao entrar na cidade de São Vicente do Sul, um dos três municípios que englobam a formação do rio, paramos no primeiro (o único, aliás) hotel, o Cavalo Branco. Amanhã, começa a navegação, o que será que o rio vai nos mostrar?
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O sol da véspera tinha sumido. No seu lugar, uma espessa neblina matinal envolvia o dia. Na estrada em frente ao hotel, ouvíamos o barulho dos carros e caminhões muito antes do vulto deles se concretizarem em formas de veículos antes de sumir novamente no mundo branco, surreal. Tomamos nosso café quente, fascinados com esse fenômeno que evoca mistérios.
Luis Ernesto Elesbão, membro do Comitê da Bacia do Ibicuí, chegou ao hotel, chimarrão em mãos, trazido por dois amigos. Dono de um hotel fazenda perto de Manoel Viana, ele topou nos acompanhar navegando toda a extensão do rio. Seguimos logo mais para o Balneário Passo do Umbu, a 18 km de São Vicente, onde colocamos nossa lancha e a canoa do Elesbão no rio, perto de uma precária ponte de madeira. A força do sol já estava derretendo a frágil neblina, colorindo a paisagem em volta ao rio – as matas verdes e bancos de areia branca. As casinhas do balneário, a maioria de madeira, também pareciam acordar com o carinho do sol e seus moradores surgiram para tocar o dia.
Pelo GPS, o encontro dos rios Toropi e Ibicuí-Mirim, que formam o Ibicuí, estava a uns 35 km rio acima em linha reta, sem contar as curvas do rio. Conseguimos avançar muito devagar, porque em todas partes havia congestionamentos de troncos de árvores e árvores inteiras arrastadas pela correnteza. Havia chovido forte na semana anterior, felizmente para nós porque o nível da água no rio estava bem cheio. Porém, assim também a água estava mais barrenta, escondendo os troncos submersos. Batemos freqüentemente com a hélice em objetos invisíveis.
No Alto Ibicuí, a maior parte da mata ciliar vista desde o leito do rio parecia preservada, apenas em alguns trechos avistamos lavouras até a margem do rio. É natural que a força de água de um rio provoque erosão das margens, arrancando árvores, mas ficamos assustados pela quantidade de troncos que encontramos no leito. Será que as águas da chuva, menos absorvidas que antigamente pelas terras em volta onde brejos foram secados, chegam ao rio com violência descomunal, derrubando mais árvores que antes?
O rio é extremamente sinuoso e navegamos ** km até chegar no encontro do pequeno Ibicuí-Mirim, que mais parece um córrego surgindo da mata fechada (seria quase impossível navegar nele), com o Toropi, bem maior. No ponto do encontro, havia uma bela praia onde paramos para esticar as pernas e coletar as amostras antes de retornar a Umbu. À noite, fizemos nossa apresentação para um auditório lotado no CEFET, escola técnica de ciências agrárias em São Vicente. Tanto os alunos como os professores e o publico em geral, exprimiram sua vontade de lutar para a preservação do rio.
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17/04/07 São Franciso de Assis
A neblina novamente cobria a cidade. A nossa equipe tem mais uma pessoa: além da original (Gerard, Tiago, Pedro e eu) e Elesbão, agora chegou Mariza Beck, do Comitê da Bacia do Ibicuí baseada em Alegrete, que descerá uma parte do rio conosco também. É encorajador ver o desempenho desse comitê, tão entusiasmado e presente na realidade do rio.
De volta ao balneário Passo do Umbú, onde deixáramos o barco e a canoa do Elesbão, tivemos uma longa conversa com o Sr. Alvarinho, presidente da associação dos 200 moradores do local. Ele estava preocupadíssimo com a precariedade da ponte de madeira, onde imensas carcaças de árvores estavam encalhadas.
Enfim, começamos a navegação. Estávamos todos agasalhados. O sol ainda não tinha mostrado a cara. Seriam 70 km até o destino, Jacaquá, mas avançamos a uma velocidade bem reduzida para evitar o choque com os troncos submersos. Em vão! Acabamos arrebentando uma pá da hélice.
Lá pelas 11 horas, estávamos em pleno sol deslizando por um rio já bem mais amplo, belíssimo. Um espelho. Novamente com poucas exceções, a mata ciliar ainda estava bem preservada. Como em todo o percurso do rio, passamos constantemente por estações de bombeamento de água para a irrigação dos arrozais: algumas estavam abandonadas. Como o período da irrigação é de novembro a fevereiro, as bombas não estavam em operação. Em muitas fazendas, elas, e até os imensos transformadores nos postes de energia, são removidos nos meses quando não são utilizados devido a uma onda de roubo dos mesmos.
No encontro como o amplo Rio Santa Maria, vindo do sul do estado e passando por Rosário do Sul, o Ibicuí se torna um rio poderoso. Debaixo do domo azul do céu sem nuvens, cercada pelas matas verdes em cada margem, com os bancos de areia surgindo nas curvas e quase nenhum sinal de vida humana, poderíamos estar navegando num trecho remoto do Araguaia!
Na palestra na CEFET, o fazendeiro Gersan Campara nos convidara a almoçar ao passarmos em frente à sua fazenda na margem direita do rio, 30 km após a confluência com o Santa Maria. Um churrasco delicioso preparado por ele na beira do rio. A fazenda é um bom exemplo dos esforços cada vez mais comuns (e possíveis) na região realizados pelos produtores que jogam um papel importante para melhorar as relações entre a lavoura e o meio ambiente. Em vez de queimar madeira, Gersan inovou, utilizando gás na secagem do arroz.
O ‘desvio’ para o almoço nos fez demorar para chegar a Jacaquá, o balneário de São Francisco de Assis, distante 18 km da cidade. O lugar estava deserto. Após a complicada operação de tirar a lancha da água, chegamos na cidade depois do pôr-do-sol. Mal deu tempo para entrar no hotel antes de sair para o local da palestra.
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Recomeçando a navegação em Jacaquá, a distância a ser percorrida seria a menor de todos os cinco dias de viagem programados. Temos muita sorte com o tempo – uma vez que parte a neblina matinal, um céu azul nos acompanha até escurecer. Nesse dia, começamos com uma frota de três barcos: nosso, o do Elesbão e agora também a escolta de três amigos dele em outra canoa de alumínio. Descemos o rio, cada um no ritmo de seu motor. Certa hora, tínhamos parado numa imensa voçoroca para tirar fotos quando, de repente, chegaram mais dois barcos, vindo de Manoel Viana.
Rio abaixo mais um pouco, encontramos mais dois barcos! O rio estava bem amplo e tranqüilo, o sol gostoso. Era hora de almoço e formamos um raft, derivando com a correnteza e comendo a sobra de um churrasco que alguém trouxera, bem à gaúcha. Havia até um cão labrador que pulava de barco em barco, feliz da vida. O grupo se autodenomina os Ibiquizeiros. São pessoas que amam o Ibicuí e zelam para sua limpeza. Anualmente, fazem uma excursão-mutirão coletando lixo nas margens ou dentro da água. Encontramos o rio bastante limpo, em termos de lixo, sendo que os lugares onde sempre havia mais bagunça eram os ranchos pesqueiros.
Chegamos todos juntos a Manoel Viana, a única cidade localizada nas margens do rio em toda sua extensão. Paramos para uma foto na rampa da cidade, e agradecemos a escolta pelo rio, única vez em todo o Brasil que isso tinha acontecido. Seguimos então para o hotel fazenda Recanto do Ibicuí, do Elesbão, onde participamos entusiasmados de um churrasco, claro!
Na palestra na EE Manoel Viana, com presença de alunos, professores e moradores interessados, percebemos que entre as maiores preocupações dos ribeirinhos com respeito ao rio – assoreamento e lixo – surgiu o assunto da monocultura de eucalipto, destinado para celulose, que está chegando a todo vapor nessa região. Os campos sulinos, bioma já bastante devastada, já foram transformados inicialmente em lavouras de soja. Há aproximadamente 40 anos, o arroz predomina como a cultura ideal para a região. O eucalipto promete ser a nova onda que vai transformar de vez as paisagens do sul.
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Estávamos de volta ao rio cedo pela manhã. Mariza voltou a Alegrete, onde estaremos chegando à noite, Elesbão deixou sua canoa em casa e migrou para nosso barco. Pela primeira vez, não havia neblina – saímos da área de influencia das serras gaúchas. O trecho da navegação levaria algumas horas até Mariano Pinto, local da balsa da estrada de terra que une Alegrete a Massambará. Depois, teremos que encararemos 65 km de estrada até a cidade para o evento da noite.
Algo interessante que estamos descobrindo pelo caminho é que, na maioria dos lugares onde procuramos informações sobre o Ibicuí antes de fazer a viagem, consta que a extensão do rio é de 290 km. Nem estamos no último dia, e já navegamos 280 km!
Tiago estava esperando com o carro no local da balsa. Como as rampas de balsa nos ajudam nesse projeto. Pena que estão sumindo em todo o Brasil, com a aposentadoria desses charmosos meios de transporte. Tiramos o barco no reboque e seguimos pela estrada de terra, 65 km até Alegrete. É tão mais agradável navegar num rio, sem pancadas e sem poeira! O calor em Alegrete estava sufocante: parecia Cuiabá!
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Pela manhã, tivemos que repetir a viagem pela mesma estrada poeirenta de volta ao rio – quase duas horas de viagem antes mesmo de embarcar no rio onde paramos na véspera. Seria a navegação do último trecho, até a foz. Estávamos novamente os três no barco: Elesbão, Gérard e eu. O rio era um espelho cada vez mais largo. O nível do rio, o Baixo Ibicuí, estava bem alto, porque ali ainda escorriam as águas das chuvas da semana anterior. Não víamos mais belos bancos da areia, apenas alguns pequenos começando a surgir.
Nos 100 km entre a balsa e a foz, passamos por apenas uma canoa de pescadores. Além do velho seu Jesusinho, pescador que encontráramos ao sair de Manoel Viana, em toda a extensão do rio não cruzamos com algum pescador em barco – um fato surpreendente se levar em conta que Rio Grande do Sul é o único estado onde a pesca não está regulamentada.
Apesar de ser um rio de grande porte que corta a metade do estado, poucas pessoas – mesmo nos municípios por onde ele passa – o usam para o lazer. Quando ele está cheio – época em que as águas são mais limpas em termos de qualidade –, tem uma beleza que se compara com o Araguaia.
Nos últimos 20 km, o leito do rio é imenso. Quando enfim surgiu a ponte de ferro, da aposentada ferrovia e por onde agora passa a rodovia com uma mão só de cada vez, sabíamos que estávamos chegando ao fim. O rio parecia um lago, batia um vento forte. Chegando à foz no bem barrento rio Uruguai, o GPS confirmou que a extensão do Ibicuí é 386 km, quase 100 km a mais do que tínhamos lido.
Coletamos as amostras em ambos os rios e demos meia volta. Tiago e Pedro nos esperavam perto da ponte, onde acharam uma rampa. E seguimos até Uruguaiana, onde uma faixa no portão do Iate Clube Tamandaré nos deu as boas vindas e fomos recebidos para um almoço por Roberto Basso, presidente do Comitê da Bacia, Mariza e outros colegas.
Seguiram discussões com respeito às repercussões da atividade arrozeira na quantidade e na qualidade da água do rio. Ao longo do Ibicuí, em especial, há esforços articulados para diminuir os impactos da lavoura no rio, visando uma trégua com a sociedade e o bom senso do gerenciamento dos recursos hídricos. Em geral, a condição da mata ciliar vai muito bem, mas algumas poucas fazendas terão que desistir de lavouras dentro das APAs nas margens do rio. Pelo sobrevôo que fizemos da região, a situação está bem mais crítica nas margens dos afluentes como o Santa Maria e o Cacequi.
De todos os rios percorridos até agora, ficamos animados com o reconhecimento dos moradores e usuários da importância de um Ibicuí limpo. O comitê dessa bacia deve ser o mais ativo, empolgado e atuante de todo o país! O desafio agora é emplacar o tratamento de esgoto nas cidades espalhadas pela bacia e investigar a fundo porque a qualidade das águas, mesmo na época quando não há extração para irrigação ou retorno dos arrozais, precisa de uma atenção especial.
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21/04/07 De Uruguaiana a Argentina
O primeiro dia que não estamos navegando no rio… e o céu ficou nublado e chuvoso! Sem problemas, agora pode chover à vontade!
Partimos os três, Tiago, Elesbão e eu, rumo a Concepción del Uruguay. Em conversas na véspera com uruguaianenses, ficamos sabendo que havia uma lista de exigências para dirigir um carro brasileiro na Argentina, e a policia se especializa em parar veículos com placa brasileira para tirar uma “mordida”. Roberto e Mariza, do Comitê da bacia, tinha me levado ao consulado para termos a lista mais atualizada. A lei argentina obriga a obtenção do seguro chamado “Carta Verde”, o porte de dois triângulos e um treco chamado Barra de Remolque, um pedaço de ferro vagabundo que supostamente serve para rebocar algum carro que pifou pelo caminho!
A vocação da policia rodoviária argentina em visar carros brasileiros é tamanha que, ao encontrar um motorista com todas as exigências em ordem, passam a cobrar o porte de um lençol branco, para eventualmente cobrir algum corpo que o viajante encontre pelo caminho! Esse fato é tão conhecido que no papel timbrado que o consulado argentino nos entregou, havia a seguinte frase em negrito para mostrarmos a um policial que passasse a demandar esse dito cujo. “No existe en la legislación argentina alguna, el requisito de llevar uma sábana blanca o ‘mortaja plástica”.
Para chegar a Concepción del Uruguay, tínhamos duas opções. Ou atravessar a fronteira Uruguaiana/Paso de los Libres e descer pelo lado argentino, ou ir até Barra do Quaraí e descer pelo lado uruguaio, atravessando o rio Uruguay na barragem de Salto Grande ou na ponte de Paysandu/Colón. Sabíamos do risco de ter algum atraso devido a piquetes nas pontes, protesto dos argentinos contra uma imensa papelera, fábrica de celulose em construção na cidade uruguaia de Fray Bentos. Optamos por este caminho, livre de caminhões.
E assim foi mesmo! A estrada é um tapete. Chegando em Salto, almoçamos no centro histórico da cidade e fomos até a ponte saber se haveria condições de passar. Negativo. A ponte ficaria fechada até meia-noite, quando os piqueteros voltariam pra casa dormir. A alfândega informou que a ponte de Paysandu abriria mais cedo, às 22h.
Perfeito, resolvemos continuar a descida. Tanto o campo como as cidades no Uruguay são um espetáculo, limpíssimos, bem cuidados. No capricho. Ficamos de bobeira na cidade de Paysandu até abrir a ponte pontualmente às 22h, e atravessamos para o lado argentino. Faltavam 45 km para alcançar Concepción, numa estrada sem sinalização, escuro, chovendo e muitos caminhões. Foi um alívio chegar no hotel.
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22/04/07 Concepción del Uruguay
Pato e Diego, ambos da UCU – Universidade de Concepción del Uruguay – nos encontraram por acaso na praça da cidade. Realmente, o nosso Land Rover, todo adesivado e cheio de lama, chama a atenção! Nos levaram a conhecer a cidade, especialmente o porto onde recentemente foi construído um muro de contenção contra enchentes, convertido num belo passeio para caminhantes e ciclistas. Contaram sobre os problemas existentes com a poluição do rio Uruguai com efluentes domésticos e industriais, especialmente de vários frigoríficos de frango. Em Concepción, são abatidos a metade de toda a produção de frangos do país e somente agora estão pensando instalar tanques de decantação! Como a maioria das cidades brasileiras, Concepción também não tem tratamento de esgoto.
À tarde, fomos ao Palácio San José, a uns 35 km da cidade, bem no campo. É um luxuoso palácio, construído entre 1848-58 pelo General Urquiza para lhe servir de residência, é o local onde ele acabou perdendo a vida, traído e assassinado em 1870.
Foi também o primeiro edifício na Argentina a dispor de água corrente, com um complexo sistema de poços e tanques subterrâneos que funcionam até hoje.
Realmente, os argentinos prezam muito sua história. Em cada cidadezinha que a gente passa, há um museu – em Concepción, são vários – e preservam muito melhor seus prédios e casas antigas. Infelizmente, no Brasil, preferimos derrubar, assim borrando nossa história como também eliminando belas edificações. O centro do Rio de Janeiro é um exemplo clássico disso.
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23/04/07 Concepción del Uruguay
Era programado para hoje um passeio de barco no rio Uruguay. Cancelado: chovia. À tarde, então, Tiago e Elesbão foram, com Ariel e Diego, a Gualeguaychú, em frente à cidade uruguaia de Fray Bentos, para ver “de perto” a construção da polêmica “papelera” da empresa finlandesa Botnia. A ponte que atravessa o rio Uruguai nessa localidade – a mais importante dos três que cruzam o rio – está permanentemente fechada pelos argentinos em protesto contra essa construção.
Num bate-papo com os piqueteros, conseguiram uma liberação para atravessar a ponte e dar uma olhada mais de perto na ‘obra’, mas na condição que não parassem de jeito nenhum e voltassem logo.
A fábrica vai ser a maior planta de celulose do mundo, produzindo pasta de celulose a partir de eucalipto plantado em milhares de hectares do campo uruguaio. Apesar dos protestos dos vizinhos argentinos, preocupados com a poluição do ar e das águas, a instalação continua a passo acelerado. O mais estranho é que o local escolhido fica nem 5 km rio acima da cidade de Fray Bentos. Terá seu próprio porto para carregar os produtos diretamente nos navios para seguir rumo ao exterior.
A indústria de celulose e de papel é altamente poluentes, especialmente quando se trata de branquear o papel – o que a Botnia alega que não vai fazer. A outra papelera que está se instalando muito próximo, da espanhola ENCE, anda mais lenta. Só podemos torcer que a empresa realmente esteja fazendo tudo, e mais um pouco, para evitar contaminação de qualquer tipo. Muitas vezes, apesar de existir controles rígidos no exterior e até a tecnologia de ponta para reduzir a um mínimo o dano colateral de uma instalação desse porte, ao construir fábricas em países do terceiro mundo, desesperados para receber investimentos e geração de empregos, não são aplicados com rigor os mesmos cuidados que ‘em casa’.
Depende agora da conscientização da população local e sua disposição de correr atrás para impor todos os meios de despoluição conhecidos e garantir sua própria qualidade de vida no futuro em ambas as margens do rio Uruguai.
À noite, demos nossa palestra em portunhol na Universidade, onde há um grande carinho pela língua portuguesa. Sentimos que há uma carência de informações e ações na Argentina com respeito à poluição das águas. Esperamos ter inspirado pelo menos os presentes na platéia a buscar uma mudança de atitude na população em geral em prol de suas águas.
Agradecemos o convite do Dr Vega, através do fotografo português/moçambicano Jaime Alves, para palestrar na universidade. Jaime está construindo com suas próprias mãos o barco “Guarda-rios”, para navegar nos rios atrás da avifauna, que é sua paixão.
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Estava na hora de começar a volta para casa. Saímos bem cedo do hotel, pegamos Jaime Alves na casa do Ariel, e aproamos o norte. Jaime vive no pueblito de Liebig, uma comunidade criada especificamente em função de um frigorífico inglês no final do século 19. É um lugar muito calmo ao redor das imensas ruínas da fábrica de carne enlatada mandada para Europa de navio.
Depois de passar pela simpática cidade de Colón, atravessamos o rio Uruguai de novo, e subimos novamente pelo lado uruguaio. Desta vez, sem a espera para a ponte, após 3 horas e meia de viagem, já estávamos chegando de volta em Uruguaiana! Nos despedimos de Elesbão, que retornou a Alegrete. Ele foi uma ótima e alegre companhia em todo o percurso, tanto pelo rio Ibicuí como também na Argentina.
Ainda faltava um bom caminho para chegar em Brasília. O carro (e Tiago que dirigiu durante a maior parte do percurso) ralou bem nessa expedição. A conta final serão mais de 8.000 km rodados.